quarta-feira, 24 de junho de 2009

OPINIÃO

DESRESPEITO E DEMAGOGIA
Quando se diz que alguns parlamentares exercem seus mandatos de forma atabalhoada, como se tivessem caído de um caminhão de mudanças, há quem ache um desrespeito. Não é. Desrespeito é um cidadão receber – ou não – milhares de votos, aboletar-se numa cadeira de deputado federal ou de senador e demonstrar não saber o que está fazendo.
Esse preâmbulo vem a propósito do anúncio, por parte do senador Antônio Carlos Valadares (PSB-SE), de que apresentará uma PEC (Proposta de Emenda Constitucional) restabelecendo a obrigatoriedade da exigência do diploma para o exercício da profissão de jornalista. A idéia do parlamentar não poderia ser mais infeliz, por ser afrontosa a todos os princípios que devem nortear o exercício da atividade num parlamento.
O sr. Valadares, como outro senador ou deputado, é pago para fazer leis. Nisso todos concordam. E por que? Por se tratar de um princípio constitucional. Se é constitucional, é legal. O que ele pretende fazer é algo digno de um grande mentecapto por se aproveitar de uma situação delicado, envolvendo milhares de jovens, para puxar o saco de alguns por um lado e criar uma situação embaraçosa pelo outro.
Ninguém desconhece que a decisão do STF em acabar com a exigência do diploma para o exercício da profissão de jornalista feriu de morte alguns setores que se beneficiavam com essa reserva de mercado inconstitucional, com um dispositivo da ditadura militar que visava apenas restringir a liberdade de expressão. Não se trata, aqui, de discutir o mérito da decisão do STF, mas o ato insano anunciado pelo senador Valadares.
Apresentar uma PEC restabelecendo a exigência do diploma é, pura e simplesmente, demagogia. O dito “representante” de Sergipe no Senado está desdizendo algo que ouvi o próprio dizer, da tribuna, de que “decisão judicial é para ser cumprida”.
A demagogia do senador Valadares é uma afronta, sim, aos princípios jurídicos deste país pois ele tenta dar uma conotação pejorativa às decisões da Suprema Corte do Brasil. Uma decisão, aliás, amparada no maior argumento que poderia refrescar a inteligência do senador, se ele a tivesse: a inconstitucionalidade. Valadares acha que, com um pedaço de papel, pode tornar constitucional o que já foi declarado inconstitucional. E o próprio Valadares, ao assumir o mandato, jurou respeitar a Constituição e o arcabouço jurídico do país. Já se viu que, por oportunismo, está prestes a quebrar o juramento.
Por que o sr. Valadares não teve a mesma iniciativa quando todo o país se levantou contra a decisão do STF no caso da demarcação da área da reserva indígena Raposa Serra do Sol? Por que o sr. Valadares não tentou reverter a decisão do Supremo no caso das células-tronco? Quantos discursos e quantos projetos o sr. Valadares já apresentou condenando os que mataram na guerrilha do Araguaia? Ladino, como todo político esperto, sabia que entraria na contramão de história e atrairia para si a ira de alguns segmentos inteligentes deste país, incluindo a imprensa e as Forças Armadas. através de jogadas demagógicas.
Não se conhece um só projeto de relevância do senador Valadares, mas se conhece acusações da imprensa do Estado dele e de jornais de circulação nacional sobre possíveis atos secretos que ele teria patrocinado em favor de uma senadora. Poderia ter permanecido quieto e calado. O mineiro Fernando Sabino, quando escreveu O Grande Mentecapto, por certo não estava olhando para Segipe, mas poderia estar.

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